terça-feira, 14 de setembro de 2010


Jaguaribe Carne e os ventos rebelionários

A música do Jaguaribe Carne (movimento artístico-cultural, grupo de intervenção poético-musical, artistas para a ação estética popular crítica e vanguardista) é uma lendária rebelião formal propondo questionamentos, belezuras, estratégias iconoclastas e uma poética libertária ao movimento artístico nordestino e brasileiro.

A música do Jaguaribe Carne é também música que funciona enquanto índice da histórica contribuição musical e artística da Paraíba para o que podemos chamar de expressão cultural brasileira – que tem tanto o maquinismo rítmico imaginoso da obra de Jackson do Pandeiro quanto a estetização da irresignação social representada pela música de Geraldo Vandré; que tem o funk-soul aveludado de Cassiano e o forrosismo cosmopolitano de Sivuca; a guitarrice pós-punk de Washigton Spínola e o lirismo rocker de Herbert Viana, o infodadaísmo de Chico César e tanta gente mais…

A música do Jaguaribe Carne é também invenção, experimento in loco, in res. É música que se define a partir da apropriação das tramas sonorosas do espaço acústico urbano, da interferência da gesticulação musical do colóquio da esquina e das possibilidades de uma fabulação acústica que se dá a partir da experimentação dos tecidos musicais através de estratégias inovadoras do uso de instrumentos e de objetos feito instrumentos. Quando Arrigo Barnabé proclamou aquela insurreição dodecafonizante nos 80, o Jaguaribe Carne já tinha quase uma década fazendo música com viola, rebelião, liquidificadores e cadeiras, cacos de vidro e berro-berimbau.

Neste sentido, a música dos irmãos Pedro Osmar e Paulo Ró, situa-se entre as tensões formais produzidas por Tom Zé e a investigação lógico-discursiva do espaço imaginativo da música realizada por Hermetho Pascoal. Há pouca mitologia, muita práxis (ação) e mais poiesis (fabricação) ainda. O conceito de guerrilha cultural permeia toda a arte do Jaguaribe Carne.


Madalena Moog e a inquietação que procura por...

Madalena Moog surgiu no início de 2001 e, desde então, vem construindo uma identidade que pretende-se própria, dançando entre o experimental europeu e a música brasileira, que é privilegiada. É o que se percebe numa simples audição da produção musical da banda: desde o estreante “As flores mortas e outros prenúncios”, de 2001, até o “Universal Park”, de 2009, que é, de modo claro é declarado, uma fria e divertida leitura da experiência “da vida”, como diria Habermas. Mas, quem ouve tudo isso (a banda tem 2 EPs e 2 CDs lançados) hoje, desconhece.

O que houve? Mudanças, sempre.

E foi uma progressividade que, parece, regrediu para melhorar. Como assim? Simples: os Moogs optaram por fazer música situada, com identidade in fine, e, para tanto, adotaram a cidade como tema: descrevendo suas ladeiras, suas ruas antigas, suas cachaçarias e seus ambientes populares.

É essa, em resumo, a proposta e a aposta que fizeram, seguindo o pensamento de que, hoje, é mais universal quem firma-se no singular. Os Moogs, hoje, não acreditam em revolução nenhuma! E a única guerrilha que fazem é contra o tempo, procurando enganá-lo o quanto podem... Não foi para isto que a arte se faz?, e que ainda se faz? Celebram, com encantamento, o desencanto que, por esse viés, assume status de... realidade da vida (Habermas novamente).

A Madalena Moog também não é uma banda regionalista, e nem pretende ser. Mas, sim, valoriza, e muito, a cultura local: enxerga suas belezas, suas feiúras domésticas, domesticáveis. Algo como: “Por que cantar as belezas de lá? Cantemos as belezas daqui, na língua do nosso povo, do nosso mapa.” E é assim que as guitarras, os metais e os sintetizadores marcam os sambas, as bossas e as marchinhas temperados pelo bom e velho rock and roll, fundindo-os numa musicalidade que procura por novidades, sempre.

Se “to define is to limit”, como diz Lord Harry à duquesa, em O retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde, a Madalena Moog prefere não se definir. Que o público faça isso, se desejar, e, depois, confunda-se, desejando ou não.


(Textos de Walter Galvão e Patativa Moog, com adaptações)

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